quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Água em Marte divide cientistas da Nasa

Brasileiro diz estar certo de que sonda Phoenix detectou líquido na superfície do planeta; americanos só vêem "indícios"
Nilton Rennó, um dos líderes da missão, afirma ter "certeza" da descoberta e aponta "politicagem" como motivo para sua negação

Nasa

Gotículas de água na perna da sonda Phoenix (no alto, à esq.)
FELIPE MAIA
DA FOLHA ONLINE
A existência de água líquida em Marte está dividindo os cientistas que trabalham na missão da sonda Phoenix, da Nasa (agência espacial americana). Enquanto um grupo diz ter certeza de que a substância existe no planeta, outros reconhecem apenas "indícios".
Até agora, Marte era considerado um deserto, em que não existe água em estado líquido. Entretanto, dados obtidos pela Phoenix, que explora o planeta desde o fim de maio, começam a mudar esse cenário.
O brasileiro Nilton Rennó, um dos líderes de pesquisa da missão, diz que a superfície de Marte tem água, apesar de sua superfície ter uma temperatura média de -53C -a substância seria inclusive abundante.
Ele apresentou seus dados na semana passada em palestra no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts). Um artigo sobre o assunto, diz, está pronto e já foi submetido à análise de uma revista científica. Rennó, no entanto, não o mostra.
O pesquisador Aaron Zent, do Centro de Pesquisa Ames da Nasa, na Califórnia, reconhece que há sinais de "água descongelada" no solo de Marte -algo como um gel-, mas nega que a substância exista em quantidade significativa.
"Antes, nós não víamos qualquer sinal de água no solo. Agora vemos de água, não gelo, água descongelada, na verdade. Mas não é algo nessa quantidade que o Nilton [Rennó] está vendo", afirmou Zent.
Na semana passada, Zent disse ao jornal "The New York Times" que a Phoenix não estava vendo "absolutamente nada" de água. Agora, ele afirma que a umidade existente na atmosfera de Marte durante o dia praticamente desaparece à noite. Portanto, as moléculas devem ir para o solo, ficando nesse estado de gel. Ele ressalta que esses dados são preliminares e carecem de melhor análise.
Os dois pesquisadores usam métodos diferentes na busca por água. Zent faz uso principalmente de instrumentos que medem a condutividade elétrica do solo, para analisar a presença de sais e a umidade. Já Rennó utilizou imagens e medidas de termodinâmica.
Nas imagens da Phoenix, é possível ver o que seriam pequenas gotículas em uma das pernas da sonda. Uma das explicações possíveis seria a de que as gotículas são resultado do gelo que sublimou (virou gás) no solo e solidificou-se ali. Entretanto, a hipótese não se sustenta, já que a perna da sonda está mais quente que o ambiente marciano.
Por isso, o cientista brasileiro afirma que as gotículas, em vez de gelo, são de uma água bastante salgada. Sais têm a capacidade de diminuir a temperatura de congelamento. As medidas da Phoenix indicam que a temperatura naquela perna varia entre -65C e -30C.
A água, segundo ele, não é uniformemente distribuída no planeta em razão do sal, que forma bolsões. "Essa minha solução tem sido bem aceita. Dentro da Phoenix ainda há uma discussão, mas eu não tenho mais dúvidas", diz Rennó.
O pesquisador Brent Bos, do Goddard Space Flight Center, da Nasa, é mais cuidadoso e afirma que a água de Marte não é "como a maioria das pessoas conhece" -parece salmoura. "Não pode ser água pura. A pressão e a temperatura não são compatíveis com isso onde pousamos", diz Bos, co-autor do trabalho do brasileiro.
Zent e Rennó não escondem a temperatura do debate. "Essa é uma razão para politicagem dentro da missão. Ele [Zent] está utilizando um instrumento que foi criado para medir água e até agora não conseguiu medir nada", diz o brasileiro.
Zent rebate: "Ele vê a coisa em uma câmera (...) Ficaria surpreso de ver o nível de água que o Nilton está vendo. Deve haver alguma água lá, mas não muito, [não] em quantidades que se pode ver", diz o cientista norte-americano.

Fonte:http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1809200801.htm